sábado, 30 de agosto de 2008

Violência e reencarnação


Uma onda de criminalidade e matanças vêm invadindo as cidades brasileiras. Encontros e reencontros de desafetos. Espíritos rebeldes e muitas vezes credores da corrupção e dos desmandos públicos estão voltando e agindo como mandam os costumes das coletividades do umbral. O problema não é exclusivamente brasileiro, mas alguns países já conseguiram superar, em parte, a gravidade do assunto.

Tempos atrás vimos num documentário da National Geographic um caso envolvendo duas famílias inimigas na Turquia que vinham se destruindo há mais de cem anos, numa horrível escala de assassinatos entre seus membros. Recentemente, provavelmente por inspiração dos mentores familiares, já esgotados em seus esforços de exortação moral, apelou-se por uma solução prática. Os anciãos das duas famílias reuniram para firmar um acordo e botar fim nas mortes, atingindo a raiz do problema: o ódio e a vingança. Para neutralizar esses sentimentos arraigados há décadas, eles decidiram promover um casamento entre os membros das duas famílias. Foram escolhidos um rapaz de 26 anos e uma menina de apenas 13 anos. Questionada sobre sua escolha, a menina declarou que aceitava a tarefa com muita honra e se sentia muito feliz por contribuir com o fim daquelas mortes. Num cálculo simbólico e político, para um determinado número de perdas ocorridas entre as duas famílias nas décadas passadas deveria nascer da união do casal escolhido uma quantidade determinada de filhos. Vidas novas. E
spíritos que antes se repudiavam agora se atraem pela força sagrada do sexo, esperançosos na experiência do recomeço. Com sangue misturado, harmônicos, neutralizam a química do ódio e o impulso da vingança. Ressurreição pura pelas vias da reencarnação.



Pacto entre famílias inimigas delimita áreas exclusivas no PE


"Um pacto de paz selado hoje em Recife (PE) entre as seis famílias em guerra há cerca de 20 anos no "polígono da maconha" cria áreas para a circulação exclusiva dos clãs e delimita territórios livres, onde a convivência entre os integrantes dos grupos rivais será permitida. Para evitar os confrontos, que já provocaram a morte de aproximadamente cem pessoas, ficou estabelecido que os Araquan e os Gonçalves poderão circular livremente em Abaré e Mirandiba.

Já seus inimigos, os Benvindo, os Nogueira, os Simões de Medeiros (conhecidos por Russos) e os Gonçalves da Silva (chamados de Cláudios) passarão a ter como base territorial as cidades de Cabrobó e Belém do São Francisco. As rodovias federais e o município de Salgueiro, pólo regional do sertão pernambucano, receberão o status de "territórios livres", onde os seis clãs dizem que predominará a convivência pacífica entre as famílias. A criação das "zonas de exclusão" atende reivindicação feita pelos Russos na primeira tentativa de acordo entre os grupos, ocorrida no dia 17 de outubro e intermediada pela Igreja Católica, Ministério Público, Justiça estadual e a CPI do Narcotráfico e da Pistolagem de Pernambuco.

Os integrantes do clã consideravam "impossível" a assinatura de um acordo de paz sem a definição de uma regra de convívio que permitisse a reaproximação gradativa dos seis grupos.

"O ressentimento de 20 anos de confrontos não vai acabar de um dia para o outro", disse um dos líderes dos Russos, o produtor rural Cristian Diniz Simões de Medeiros, 32. "Um toma uma cachaça, vem outro e toma também e pronto, o acerto acaba em dois dias", justificou.

Outro impasse levantado na época, pelos Araquan, também foi solucionado na reunião realizada ontem na Assembléia Legislativa do Estado: a reivindicação de anistia para os 22 presos da família. Os Araquan só concordavam com o pacto de paz se o número de presos dos dois lados fosse igual. Como os rivais têm apenas três integrantes cumprindo pena, eles exigiam que a Justiça anistiasse 19 condenados da família ou prendesse 19 dos clãs rivais. A solução veio do juiz das execuções penais, Adeildo Nunes, que participou da reunião. Ele prometeu agilizar os processos de julgamento e autorizou a transferência de 13 detentos, de um presídio de Recife para a unidade penal de Salgueiro.

O presidente da CPI do Narcotráfico e da Pistolagem, deputado Pedro Eurico (PSB), disse que o acordo poderá fazer até com que alguns deles respondam o processo em liberdade, porque vários pedidos de habeas corpus já foram negados em razão do risco de envolvimento dos presos em novos confrontos.

Os clãs, disse o parlamentar, se comprometeram a entregar as armas que possuem, e a Secretaria da Defesa Social (equivalente à Segurança Pública) será acionada para intensificar as operações de desarmamento no sertão. Para tentar afastar do plantio e do tráfico de maconha alguns integrantes das famílias envolvidas nos conflitos, a CPI se comprometeu também a reivindicar linhas de crédito agrícola junto aos bancos do Nordeste e do Brasil.

O documento com os pontos do acordo deverá ser redigido e assinado ainda esta semana. Depois de seis meses, todos os envolvidos deverão se reunir novamente para avaliar a situação e revisar o pacto, se necessário".

Fábio Guibu, da Agêntcia Folha, em Recife

sábado, 23 de agosto de 2008

Finalmente, cinema espírita!



Desde sexta-feira, 29 de agosto, os espíritas brasileiros têm nas próximas semanas um compromisso histórico, obrigatório e intransferível. É o ingresso decisivo do Espiritismo no cinema nacional: direção, roteiro, produção, atuação, tudo feito com arte, carinho e dedicação de artistas espíritas. Só falta o público espírita da primeira hora, o exemplo para alavancar as bilheterias e transformar o sonho em realidade. Se for sucesso de público, têm todas as chances de ir para a TV e para o mercado internacional
Realizado com a mais avançada tecnologia digital e finalizado em 35mm, o longa-metragem “Bezerra de Menezes - O Diário de Um Espírito” fará uma fiel reconstituição de época para representar o Ceará e o Rio de Janeiro do Século XIX. Com cuidadosa pesquisa história de Luciano Klein, biógrafo de Bezerra de Menezes, aliada a extensa pesquisa iconográfica nos acervos mais importantes do país, a vida de Bezerra de Menezes será contada com passagens ficcionais e relatos de pesquisadores de sua vida e obra. A produção teve locações no Ceará, Pernambuco e Rio de Janeiro e contou com o talento do ator Carlos Vereza interpretando Bezerra de Menezes, além de grande elenco de artistas cearenses.



O Médico dos Pobres

Antes de Eurípedes e Cairbar, dois personagens também tiveram atuações marcantes como pioneiros do Espiritismo apostólico no Brasil: educadora Anália Emília Franco e o médico Adolfo Bezerra de Menezes.O Dr. Bezerra, cearense de Riacho do Sangue e conhecido no Rio de Janeiro como “o médico dos pobres”, interessou-se pelo Espiritismo ao ler O Livro dos Espíritos, presente do seu primeiro tradutor em língua portuguesa, o Dr. Joaquim Carlos Travassos. Alguns anos depois, no dia 17 de agosto de 1886, diante de um público de quase duas mil pessoas, no salão de honra da Guarda Velha, declara sua adesão à Doutrina Espírita. Essa atitude tinha sido provocada por um teste pelo qual Bezerra submetera a mediunidade do homeopata João do Nascimento. Bezerra solicitou uma receita para si mesmo, dando dados pouco esclarecedores sobre sua saúde. O diagnóstico veio rápido e confirmava a existência de uma dispepsia. A notícia foi dada em diversos jornais da Capital como mais um simples evento cultural promovido pela Federação Espírita Brasileira. Porém, o seu protagonista não era mais um dentre os inúmeros conferencistas que lá compareciam para expor suas idéias e sim uma espécie de mito vivo, daqueles que as pessoas comuns e as existencialmente indecisas ficam observando, ainda que de forma inconsciente, olhando-as como bússolas a oferecer um Norte para suas vidas sem rumo:


“Foi grande ontem a concorrência de senhoras e cavalheiros no salão da Guarda, para ouvirem o Dr. A. Bezerra de Menezes. O orador começou explicando os motivos poderosos que o levaram a abraçar o Espiritismo, dentre os quais denominava o preceito de que os princípios da religião estão fora do alcance da compreensão da razão, preceito que assim inutiliza a ação da mais elevada faculdade do homem. Foi estudando a moral e a teogonia romana que o orador se convenceu da veracidade dos ensinos espiríticos, completamente conformes com aquela, e se discordam desta, é por ser esta, como ele demonstra, o fruto de interpretações humanas. Tratou depois largamente da Doutrina Espírita; sendo acolhido, ao terminar, por calorosos aplausos”


Sobre a leitura da primeira edição brasileira de O Livro dos Espíritos, publicada em 1875 pela livraria Garnier, Bezerra comentou depois que, ao ler Allan Kardec, tivera uma dupla reação: ficou, ao mesmo tempo, admirado com aquele universo de revelações e também com a sensação de que nada daquilo lhe era estranho. Seu anúncio em público teve um grande impacto na Corte Imperial, pois o regime era ainda muito atrelado ao clero católico. Além disso, Bezerra havia sido vereador por dois mandatos e tornara-se deputado-geral. Escrevia, agora, artigos espíritas sob o pseudônimo de “Max” no jornal “O Paiz”, dirigido por Quintino Bocaiúva. A família deixada no Ceará também não lhe perdoou o gesto, acusando-lhe de renegar a religião de berço, como se renegasse o leite materno. A crítica vinha de um irmão e foi para ele que Bezerra enviou uma carta na qual expõe todo o seu sentimento sobre o novo compromisso ideológico. A carta tornou-se um dos opúsculos mais lidos de Bezerra e, num dos trechos, o bom médico confessa ao irmão o porquê da mudança:

“Não sou cristão, porque meus pais me criaram nessa lei e me batizaram; mas, sim, porque minha razão e minha consciência, livremente agindo, firmaram minha fé nessa Doutrina sublime, que, única na Terra, eleva o Homem, em Espírito, acima da sua condição carnal – que, por si mesma, se revela obra de infinita sabedoria, a que o Homem jamais poderá chegar. Tendo diante dos olhos de minha alma o código sagrado da revelação messiânica, procuro, sem descanso, arrancar de mim os maus instintos naturais e substituí-los pelas virtudes cristãs. Tendo fé, tenho esperança e, quanto à caridade, procuro tê-la o mais que me é possível, na medida do ensino de São Paulo. Não guardo ódio e perdôo as injúrias, evito fazer o mal e procuro fazer bem aos próprios que me odeiam.”


Nesta carta encontramos uma concepção muito diferenciada do Espiritismo que se praticava naquela época, no Brasil e na Europa, e que veio persistindo e ainda persiste em nossa época. Note-se que Bezerra de Menezes já havia superado as primeiras características das pessoas que se tornam Espíritas, apontadas por Allan Kardec. Tinha plena consciência da importância da transformação moral e do que era o trabalho de auto-análise e reformulação interior e qual o papel que o Espiritismo tinha que realizar nesse setor delicado da experiência humana. Aliás, como mudar a sociedade se não houver mudança de comportamento e de atitudes? Se não era essa a finalidade do Espiritismo, qual a vantagem de deixar de ser católico, protestante ou mesmo ateu? Por que adotar um novo ideal de vida, se continuamos esperando que as mudanças venham de fora para dentro? Deve ter sido essa a intenção de Bezerra ao responder ao irmão o significado da sua nova fé. É bem verdade que tais mudanças não ocorreram somente no campo intelectual e no muno do teórico-filosófico. Nem tudo era poesia e calmaria, pois na sua trajetória existencial as mudanças foram precedidas por severas provações severas, como um processo de adubação do solo moral. O biógrafo Francisco Acquarone mostra que o nome e a legenda em torno de Bezerra de Menezes foram construídos com sacrifícios e decepções que a maioria dos destacados militantes do Movimento Espírita nem ousaria pedir como prova. De fato, a vida de Bezerra foi, sem exagero, de completa renúncia, longe do egoísmo e da busca de notoriedade que tanto cultivamos e buscamos em nossas medíocres experiências, na vida comum e no ideal espírita. Bezerra não fez parte do corpo de trabalhadores espíritas da primeira hora, mas, pela própria natureza do seu caráter, se impôs, sem o querer, como o líder natural de todos os nomes que aparecem na lista dos históricos fundadores do Movimento Espírita Brasileiro. O Bezerra encarnado, militante espírita, político, ser humano sujeito aos altos e baixos da rotina cotidiana, é bem diferente desse Bezerra Espírito, cuja imagem mística foi sendo construída ao longo dos anos e que tendeu para uma espécie de santificação, dado o grande interesse do público religioso pelas suas atividades curativas. Muitos se chocam ao saber das suas preferências doutrinárias, das suas batalhas políticas contra os adversários ideológicos, achando que, pelo fato de ter sido um cristão exemplar, era ingênuo, imaturo e se deixava levar pela leviandade de querer agradar a todos. Todos os membros do Grupo Confúcius, sem exceção, viam em Bezerra uma autoridade espontânea para conduzi-los na busca de seus objetivos. Isso significa que viam nela a difícil habilidade de gerir conflitos. Eram elementos ligados à Medicina Homeopática e conheciam a história do médico que abandonara a estabilidade da vida militar, para dedicar-se aos riscos da política; conheciam também a sua fama de médico cristão e profundamente caridoso. Mas seu prestígio parlamentar e sua notoriedade moral não eram meros acessórios sociais e sim ferramentas para remover obstáculos que exigiam muita paciência e obstinação. Foi desse grupo, que durou apenas três anos, que surgiram as primeiras traduções brasileiras das obras de Allan Kardec.


Bezerra era orientado, pessoalmente, pelo Espírito Santo Agostinho, o propositor da idéia do compromisso e da técnica de reforma íntima, contida nas questões 918 e 919 de O Livro dos Espíritos. No auge do cisma, para convencer Bezerra a dirigir a Federação Espírita Brasileira, naquele momento um autêntico “presente de grego”, Bittencourt Sampaio sugeria-lhe a prática da homeopatia para viver dignamente e doar-se sem preocupações ao novo trabalho. Bezerra respondeu que não entedia “patavinas” de homeopatia e que usava a medicina dos Espíritos e não as dos médicos. O médium Frederico Júnior também estava presente e, através dele, manifestou-se Santo Agostinho, confirmando as palavras de Sampaio e querendo dizer que Bezerra fazia muito mais do que os homeopatas. Bezerra reagiu, educadamente, perguntando a Agostinho se lhe sugeriam ganhar dinheiro com o Espiritismo. O Espírito respondeu certamente que não, mas que o ajudaria a ganhar a vida dignamente e que, nas horas mais difíceis, lhe traria “alunos de matemática”. Bezerra entendeu o recado lembrando que, certa vez, num momento de dificuldade financeira, quando ainda era aluno da faculdade, apareceu alguém pedindo-lhe aulas particulares de matemática; o cliente pagou adiantado e nunca mais voltara para tomar uma única lição. O Espírito Agostinho insistiu para que Bezerra aceitasse o convite de Sampaio, lembrando que a união dos Espíritas dependia da sua boa vontade de homem e que eles, os Espíritos, dependiam dela para realizar o trabalho deles. O convite foi aceito e daí em diante o movimento espírita, como todos sabemos, não foi mais o mesmo. Bezerra deu a ele um novo tom, uma nova afinação com o seu diapasão inconfundível. Além da natural presença de espírito, marca pessoal de sensibilidade, Bezerra trazia uma enorme bagagem política, fator que facilmente poderia denegrir a imagem do Espiritismo, mas que em suas mãos significou um habilidoso instrumento de negociações num grave e delicado momento da efetivação da Doutrina em nosso país. Para os espíritas e adversários do Espiritismo Bezerra possuía todas as virtudes que engrandeciam ou os defeitos que diminuíam a importância da mesma. Mas para a opinião pública, tradicional expectadora de exemplos, ele continuava sendo inatacável, pois o seu perfil humanista estava acima de qualquer opinião doutrinária. Quando do seu desencarne, também a maioria dos jornais fluminenses noticiou o fato e nenhum deles deu publicidade de sua crença ou filiação filosófica, mas sim ao caráter e a imagem que os habitantes da cidade do Rio Janeiro tinham da sua pessoa:

“Sucumbiu ontem, às 11h30, após longos e dolorosos padecimentos, que foram a última prova imposta à sua resignação verdadeiramente cristã, o eminente brasileiro cujo nome, encimando estas linhas, como homenagem póstuma às virtudes da sua vida, por tantos anos fulgurou nos anais da política do império e hoje, apenas vive na tradição dos que o amaram, ou da inexaurível fonte da sua bondade receberam inesquecíveis benefícios. Foi esta a característica essencial do venerado extinto. Político militante, filiado à mais adiantada parcialidade do antigo Partido Liberal, deputado, vereador da extinta Câmara deste município, a cujos destinos por longos anos presidiu; escritor – que o era com raro merecimento e brilho – em todas essas manifestações da sua atividade, deu sempre o Dr. Bezerra de Menezes as mais brilhantes provas de sua capacidade, do seu valor moral e intelectual; mas foi sobretudo no abnegado sacerdócio da sua clínica e na doce penumbra da sua vida íntima que mais refulgiram os peregrinos dotes de seu espírito, multiplicando-se em desvelos, em solicitude, em carinhoso desinteresse por todos os que sofriam. E jamais bateu um desses, enfermo ou necessitado, inutilmente á sua porta.Tempo houve em que, fascinado pelo desejo de servir á sua pátria, em cargos públicos, exclusivamente de confiança popular, como acabamos de aludir, substituiu o exercício da Medicina pela tribuna parlamentar ou pelos onerosos encargos de chefe da Municipalidade, em que se conservou perto de vinte anos (...) Passou através das grandezas deste mundo e do fastigio do poder sem lhes sentir a vertigem, sobranceiro, indiferente, alheio a ambições, tendo pelas seduções da fortuna um desprezo que tanto contrasta com o culto hoje incondicionalmente rendido a essa mesquinha preocupação, cujo cultivo, em certas camadas da sociedade contemporânea, tanto rebaixa o espírito da nossa nacionalidade.É realmente edificante, no meio das ambições que na hora presente se disputam entre nós a posse das melhores posições, para a ostentação de inesperadas opulências, opor exemplo desse grande cidadão, que não é mera figura – encaneceu no serviço da Pátria e da Humanidade e, tendo entrado para a vida pública com fortuna, dela se retirou pobre, depois de haver exercido, gratuitamente por um largo período, o cargo de vereador, que não era então remunerado, em ter tido em suas mãos, como seu presidente, as chaves da Municipalidade, de que não se utilizou, senão para assegurar-lhe as condições de prosperidade, de que rezam as tradições desse tempo (...) Assim, de fato, viveu esse grande homem, misto de interesse, de abnegação, de fé e de grande moral, e que, de sessenta e oito anos, voltados à atividade constante do trabalho, extremo de ambições vulgares, sai da vida, deste charco, que o não conspurcou, cercado de uma auréola de virtude e através de uma glorificadora apoteose de bênçãos e lágrimas (...) A sociedade brasileira, particularmente a sociedade fluminense, contraiu com o venerando morto uma dívida que, revertendo em benefícios de sua família, honrará a memória daquele que tantos serviços lhe prestou. Resta que a pague, provando assim que a ingratidão não é a única moeda com que o povo costuma retribuir sacerdócios dos que serviram à Pátria e à Humanidade (...)” – O Paiz, 12 de abril de 1900.



NOVA HISTÓRIA DO ESPIRITISMO - Dos Precursores de Allan Kardec a Chico Xavier

domingo, 17 de agosto de 2008

A Cidade Luz no tempo de Kardec



Boulevard des Italiens, por Edmond Granjean. Cenário do encontro de Rivail e Carlotti.


Paris retratada nas gravuras de Rouarque. Rua Rivoli.

Palais Royal


Escola de Belas Artes


“(...) Atualmente, o visitante que chega a Paris encontra de 1,5 a 2 milhões de habitantes. Em 1860, os muros fortificados se tornaram limite da municipalidade – são mais de 35 quilômetros de circunferência, com 66 entradas ou portões. A cidade é dividida em vinte arrondissements, ou circunscrições administrativas, governadas pelo prefeito do Sena, o barão Georges Haussmann, e seu conselho municipal. O moderno e elegante quarteirão compreende a alegre e magnífica rue de Rivoli, a Place Vendôme, o Boulevard des Italiens e Champs Elysées. O palácio das Tulheries é a residência do imperador e da imperatriz, em Paris; na Île de la Cité estão os tribunais, a chefatura central de polícia e o grande hospital; não há nada de semelhante à “City” londrina – a Bolsa de Valores perto do quarteirão da moda. No Faubourg Saint-Germain, situado na margem esquerda do Sena, localizam-se as grandes e belas mansões da nobreza, em algumas das quais se mantêm as tradições da velha sociedade francesa; no vizinho Quartier Latin, milhares de estudantes levam uma vida de rebeldia e desregramento moral que o estrangeiro mal consegue entender. A leste, Faubourg S. Antoine, outrora estufa de terror e insurreição, há numerosas manufaturas e moradias operárias. Nas cercanias, como no Faubourg S. Vitor, Mouffetard, Belleville, etc., vivem os segmentos mais pobres da população.


Paris, entretanto, pode se orgulhar de ter menos antros de miséria, devassidão e vício do que as vizinhanças de Tottenhan Court Road ou Drury Lane exibem. Há cerca de 4 mil hotéis e hospedarias, carregando em seus nomes sinais da entente cordiale – daí, Chathan, Bristol, Windsor, Manchester, Brighton, Liverpool, Westminster, Dover, Bedford, Canterbury, Richmond, Lancaster, Clarendon, Nelson, Byron, Walter Scotch, Prince Regent, e vários Albions, Londres, Victorias, Îles Britanniques e Angleterres.
(...) Paris exibe com orgulho pelo menos 20 mil cafés. Os mais higiênicos apresentam ao visitante um cenário animado, decorado com sofás luxuosos, espelhos, enfeites e adornos dourados de bom gosto; todos os artifícios capazes de atrair e reter o visitante estão expostos – jornais diários, tabuleiros de damas e xadrez, dominós, baralhos e bilhares. Servem-se café, chocolate e excelentes licores a preços razoáveis. Os salões podem ser freqüentados livremente por senhoras. Prevalecendo o máximo decoro, as conversações transcorrem em voz baixa, o que constitui uma atração a mais nesses lugares populares de diversão. Em geral, só se permite fumar à noite. Tortoni, no Boulevard des Italiens, é famoso por seus sorvetes cremosos e de frutas. O Café du Helder é conhecido por seu absinthe, um licor alcoólico que, tomado em qualquer quantidade, pode ser danoso ao bem-estar físico e moral; abre depois do teatro e a comida é caríssima (meio frango, quatro francos!) O Café Leblond Favre, na Passage de l’Opéra, é onde os corretores de ações da Bolsa tomam seu desjejum; refrigerantes à base de vinho de xerez, limão, açúcar, xarope de menta, grogue norte-americano e outras bebidas ianques à disposição. O Café de Suède fica no Boulervard Montmartre; em cubículos fechados, depois do teatro, servem-se sopas de ganso aux marrons, chucrute e salada de batatas a uma clientela literária e jornalística, de tendências políticas radicais. Le Guillois, excêntrico editor do jornal Le Hanneton, costuma ser visto por lá, sempre fingindo ler um exemplar e resmungando alto, ridiculamente: “Este jornal é extraordinário! Críticas excelentes, paginação inteligente! É tão barato! Realmente, esse Le Guillois é um homem incrível, merece fazer sucesso.


(...) Quando a noite chega, Paris, a Cidade-Luz, converte-se num verdadeiro charivari de prazeres, cabendo ao visitante apenas uma certa cautela, para não lamentar, mais tarde, ter cedido com presteza ávida demais aos apelos da sereia – tentações e bebedeiras – cujos efeitos podem ser catastróficos.Grand Opéra, na rue Lepelletier, é a Ópera francesa, construído às pressas, em 1821, em substituição ao prédio da rue Richilieu, na porta da qual o duque de Berri foi apunhalado, e que por isso foi abaixo. Em 1858, defronte ao seu pórtico, três italianos tentaram assassinar o imperador e a imperatriz, de sorte que essa edificação também está sendo substituída por uma esplêndida construção projetada por Monseur Garnier, e deve ser inaugurada em 1871 (...) As reservas para todas as apresentações teatrais parisienses podem ser feitas num escritório central, situado no Boulevard des Italiens; evite os cambistas, que vagueiam do lado de fora dos teatros mais populares – suas ofertas são excessivamente caras e quase sempre inteiramente falsificadas!(...)


Além da profusão de igrejas, monumentos, galerias e vistas que todo turista conhece bem, chamaríamos a atenção dos visitantes para a MARCHA DO PROGRESSO evidenciada por essa grande cidade. Cada quarteirão de Paris parece admiravelmente renovado. O antiquário sentimental pode chorar a perda da velha Paris e seu passado romântico, assim como o moralista empedernido há de deplorar a glória atribuída à riqueza; mas com toda a justiça outros devem rejubilar-se pelo triunfo da ciência e da higiene modernas.
(...) São 35 linhas de ônibus que cobrem os principais pontos da cidade, das 8:00 à meia noite. Damas não podem viajar no andar superior: são freqüentes as quedas fatais de gente que escorrega na hora de descer os estribos... Pequenos botes a vapor cruzam o Sena: são conhecidos como muches – moscas, ou andorinhas. Cuidado! Recomenda-se a maior precaução com as floristas, nos bals publics, cafés chantants e à saída dos teatros, e com os manhosos avanços de mulheres bem-vestidas e falantes... Nos mercados, barganhar é regra... Não há vendedores ambulantes de peixe em Paris. Todo o pescado é vendido no mercado. Atenção com os judeus vendedores de binóculos para teatro, jóias folheadas, etc., que podem oferecer ao visitante literatura e ilustrações licenciosas: tais artigos são proibidos. Cautela com os zeladores ou encarregados de prédios de apartamentos. Caso se sintam ofendidos, eles poderão causar terríveis aborrecimentos, extraviando cartas, dando informações erradas às visitas e espalhando maledicências nas redondezas.Deve-se evitar discussões políticas. A vigilância policial é ubíqua, e seus agentes detêm amplos poderes para fazer detenções e prisões. Sábio será quem se expressar com grande comedimento ao falar do imperador e do governo da França, eximindo-se de fazer ou comentar qualquer coisa que possa acarretar diminuição da entente cordiale que existe entre nossas nações.”


Guia turistico londrino sobre Paris - Citado por Rupert Christian in "Paris Babilônia"

Nova História do Espiritismo


Moda em 1860

Paris em 1859

Paris romana: Lutécia

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

Provas, deuses e heróis



Na Grécia antiga os jogos olímpicos eram uma celebração do Espírito Encarnado, um culto aos deuses, entidades imortais, isto é, evoluídas e mais experientes, que já habitavam o Olimpo, a utopia de um mundo perfeito e feliz dos gregos. Era também homenagem aos heróis, seres humanos que conquistavam esse status espiritual pelos seus esforços “hercúleos” durante a existência física. A maioria desses campeões das lutas contra si mesmos tinha sangue misto, pois eram considerados descendentes dos deuses, revelando suas origens divinas. Eles atingiam essa condição heróica superando os obstáculos do corpo e os limites da mente, sofrendo as mais duras provações circunstanciais.

Por inspiração dos gênios espirituais da Hélade, essas verdades, ainda que em metáforas, foram transpostas para as competições olímpicas, cujas provas difíceis certamente simbolizavam as dificuldades da vida e a exigência constante da coragem e da persistência. O soldado de Maratona, que sucumbiu fisicamente após correr 42 quilômetros para alertar sobre o perigo da invasão inimiga, tornou-se um exemplo universal dessa força moral. O corpo pereceu pelo esgotamento, mas o Espírito despertou forte, vibrante e vitorioso, sobretudo com intensa sensação de alegria pelo dever cumprido.

Esse evento cultural grego tinha também a intenção de cultivar a paz e a fraternidade entre as cidades-Estado, modelo político de todas as nações contemporâneas, seja da aristocracia ou da democracia. Era necessário tentar evitar a experiência dolorosa e destrutiva das guerras, mesmo fracassando nesse aspecto, que é na verdade uma fraqueza das civilizações.

Ainda hoje, como vemos, os jogos da Antiguidade repercutem fortemente nos tempos e entre os países modernos. Neles enxergamos nitidamente os ideais de Esparta e de Atenas. A China, terra de Confúcio e Lao Tsé, exemplo secular de paciência e superação, mesmo passando recentemente por uma difícil provação coletiva, preparou para o mundo uma grande festa para honrar a sua luta e vitória contra a adversidade.


A habilidade e a competência espiritual

“Estamos em guerra, não há dúvida (...) Refiro-me à guerra cotidiana, essa que pelejamos mal começa o dia. Guerra não declarada, não percebida pela maioria – mas guerra de fato (...) É a guerra do leite, da carne, do pão, da manteiga, do emprego, do amigo, do inimigo, do lotação, do trem , do elevador. Batalhas tachistas, indeterminadas e sinuosas. Não obstante, duras.”- Ferreira Gullar – in “O Menino e o arco-íris”


O exercício moral está para o espírito assim como o exercício físico está para o corpo. O exercício fortalece o corpo e dá a ele maior resistência ao cansaço e esgotamento gerados pelos esforços desgastantes. Já o exercício moral fortalece o espírito, dando ao mesmo maior resistência ao desânimo,à desesperança e desencantos causados tanto pelas decepções e fracassos corriqueiros do dia-a-dia, quanto nas grandes provações da existência. O exercício físico transforma o corpo numa ferramenta precisa, que obedece com sincronia elétrica ao comando do cérebro. O exercício moral também transforma faculdades mentais do espírito em instrumentos de alta precisão psíquica, sob controle da força de vontade e da espontaneidade das atitudes nobres. O primeiro integra o ser nos ambientes externos, onde sofre e resiste aos obstáculos e limites biológicos dos planos objetivos da matéria. O segundo integra o ser no seu ambiente interno, onde ele também sofre e resiste aos obstáculos e adversidades psicológicas, no plano subjetivo.

É verdade antiga e notória que o aperfeiçoamento do corpo físico fortalece o espírito, assim como o aperfeiçoamento mental reflete no corpo físico, em forma de força e resistência. Mas, apesar dessa admirável reciprocidade, a questão que nos parece essencial é que o corpo físico é sempre efêmero, transitório, um meio instrumental, enquanto o espírito é imortal, eterno e de finalidade evolutiva permanente. Um morre, em espiral regressiva, e se transforma nos elementos da sua origem material. O outro sobrevive e também se transforma, em espiral progressiva, retornando ao convívio das suas origens espirituais.

Então, na experiência existencial, o produto dessa integração corpo-espírito é que o espírito sempre colhe os melhores resultados dos esforços despendidos durante as provas. O produto do esforço físico termina no túmulo, se dele o espírito não souber subtrair dividendos psicológicos positivos. Já o produto do esforço espiritual supera a escuridão do túmulo e da consciência e penetra nos ambientes cada vez mais iluminados e perfeitos do universo metafísico, onde o corpo físico e suas sensações grosseiras e exteriores não possuem nenhuma utilidade. Nesses planos sutis o ser realiza experiências através dos sentidos interiores – a emoção equilibrada, a intuição, a clarividência – e muitas outras percepções ainda desconhecidas nos mundos físicos.

As faculdades psíquicas de alta precisão e percepção, típicas das inteligências superiores, somente são desenvolvidas através das experiências morais probatórias, pelo despertamento consciencial. Nelas o espírito, por vontade própria ou por imposição expiatória, se envolve em situações críticas, de alto risco existencial, porém de alta potencialidade ressurreicional. Nessas circunstâncias, não bastam, portanto, o uso das inteligências lógicas, mas sim das capacidades psicológicas, de habilidades emocionais, geralmente adquiridas nos momentos de graves decisões e escolhas delicadas. Essa inteligência superior, além dos limites da razão e maturada pelo sofrimento em mundos inferiores, está sintetizada na lei do livre arbítrio e no aforismo “a semeadura é livre, mas a colheita é obrigatória”. Quem desconhece esse aspecto da educação metafísica não consegue compreender nem aceitar as provas, o sofrimento, a resignação e a humildade como poderosos fatores de inteligência e evolução espiritual. São esses os famosos tesouros que não enferrujam e que a traça não destrói. Este é o significado central da lição das bem-aventuranças ensinadas por todos os grandes educadores do espírito, iniciados na pedagogia cósmica e intuídos pela Consciência Universal.

Nas aparências exteriores, esses discursos crísticos e redentores – sempre vivenciais, exemplificados com atitudes – se mostram num primeiro momento, aos olhos comuns, como absurdos e contraditórios, pois que estão sendo observados somente pela ótica racional biológica. Mas, na perspectiva psicológica espiritual, essa aparência exterior se transmuta numa verdade nada absurda e contraditória, revelando as nuances do percurso entre a imperfeição e a perfeição relativa da experiência existencial; e depois desse primeiro estágio, o novo percurso entre a perfeição relativa e a perfeição absoluta, busca constante e infindável do nosso destino espiritual, sempre de acordo com o nosso esforço e merecimento.

O Monte Olimpo, na Grécia, utopia do mundo perfeito, destinado aos deuses da espiritualidade e aos heróis da carne.


sábado, 2 de agosto de 2008

Augusto César Vanucci


A obra de Chico Xavier, que até o ano do seu desencarne ultrapassou a casa dos 30 milhões de exemplares vendidos, não poderia permanecer restrita aos livros. Tratava-se de uma temática literária cuja diversidade teria que ser, mais cedo ou mais tarde, transmutada para em outras linguagens artísticas. Quem de nós, ainda hoje, não sonha em ver nas telas do cinema e da TV uma grande e sofisticada produção das obras de Emmanuel, André Luiz ou Lúcius? Ficamos imaginando que algum produtor de Hollywood um dia vai se interessar pelo assunto. Por que nenhum diretor do cinema de arte europeu não filmou ainda a história de Allan Kardec, mostrando a Paris dos primeiros tempos do Espiritismo?
Enquanto sonhamos é bom lembrar que grandes autores de novelas como os pioneiros Ivani Ribeiro, Janete Clair , Dias Gomes, e seus sucessores Benedito Ruy Barbosa, Walcir Carrasco, Glória Peres, Maria Adelaide Amaral e Agnaldo Silva, quando não trataram diretamente do assunto espiritismo, não perdem a oportunidade de colocar temas com forte teor de espiritualidade em seus roteiros. Mesmo que, em termos mercadológicos e de audiência, esses temas se tornaram praticamente obrigatórios nas novelas e mini-séries brasileiras, não se pode negar que muitos desses autores e diretores, na condição natural de médiuns, foram não somente influenciados pelos precursores, mas também porque passaram por provas pessoais que os conduziram positivamente para o texto de impacto esclarecedor e de “conspiração” artística espiritual. No Brasil dois nomes merecem ser lembrados como importantes pioneiros da arte e comunicação espírita de massa: os mineiros Wanda Marlene dos Santos e Augusto César Vannucci, que tiveram muita vontade, nem sempre com todas as condições, de transformar sonho em realidade. Foi um esforço histórico, de lançamento de sementes em terreno resistente e árido e que só depois de muitos anos iriam germinar. No início da década de 1960 a atriz Wanda Marlene ocupou um precioso espaço cedido pela TV Itacolomi, de Belo Horizonte, para produzir e levar ao ar algumas obras mediúnicas de Emmanuel. O ponta-pé inicial da série foi dado em 1961 com “Lívia”, adaptada do romance Há Dois Mil Anos, seguido de “O Grande Testemunho” (do livro 50 anos depois), Renúncia e concluída em 1964 com Ave Cristo. Para o ano seguinte previa-se a produção de Paulo e Estêvão. O “Anuário Espírita 1965” registrou como colaboradores do trabalho precursor de Wanda um numeroso elenco: Zélia Marinho, Geraldo de Oliveira, Vilma Henriques, Tales Pena, Nilda Almeida, Sérgio Luiz, Wantencyr Mattos, Carlos Farah, Toni Vieira, Anaíde Martins, Ari Fontenelli, Rogério Falabela, Jota Barroso e outros.Iniciado pelas mãos de Pascoal Carlos Magno, no Teatro do Estudante, Augusto César Vanucci, nascido em Uberaba, médium intuitivo, faria uma trajetória mais ampla, ocupando espaços de comunicação mais abrangentes como as grandes redes de televisão no Rio e em São Paulo. Discípulo de Chico Xavier, dividido pela prova do poder, entre o dever, a imagem profissional, e o ideal filosófico, Vannucci decidiu romper as amarras das aparências e, como Wanda Marlene, partiu para “tudo ou nada e seja o que Deus quiser”. Dono de um perfil cobiçado nos meios artísticos, no mercado promissor nas décadas de 1960 e 1970, em meio a perturbações cármicas e dramas familiares, o grande diretor deixou sua marca no maior veículo de comunicação de massa do século XX: “A verdade confessa era que eu assumia, mais ou menos, postura espiritualista, mantendo, todavia, os pés presos no materialismo. Depois de trabalhar em 146 peças teatrais, 30 shows noturnos, dirigir para a TV Globo 4.100 programas, descobri, numa viagem astral, em conversação com amigos espirituais, que o verdadeiro trabalho estava por vir”.

Essa luta entre o ser e o não ser, uma constante no trabalho de Vannucci, num delicado terreno onde predomina a vaidade e a ânsia pelo sucesso, foi assim comentada pelo jornalista e autor de TV, Eloy Santos[94]:

“Teatro, cinema, televisão. Essas três expressões da arte e da cultura brasileiras tiveram, no correr das últimas quatro décadas, a presença e o talento cintilante de Augusto Cesar Vannucci. Como um mestre do ofício, ele deixou sua marca pessoal em tudo. Marca do gênio. (...) Quer queira ou não este país sem memória, Augusto Cesar Vannucci é, hoje, uma referência importante na história da TV mundial. Lendo essas linhas, como eu sei que ele está lendo, vai dizer: ´O Eloy fez bobagem. Minha contribuição maior à televisão foram os programas que falam de espiritualidade...´ É verdade. Quando se discutia a sua obra na TV, Vannucci destacava programas como ´3ª Visão´, ´Percepção´, `Fronteiras do Desconhecido´ e o especial ´Chico Bondade Xavier´. Para ele sempre valeu mais a pena dar o espaço para os `Espíritos do Senhor que, semelhantes a estrelas cadentes, vêm iluminar o caminho e abrir os olhos aos cegos´. Aqui, um parêntese: também nos anos 1980 Vannucci produziu e dirigiu a peça ´Além da Vida´, com textos de Francisco Cândido Xavier e Divaldo Pereira Franco. Ela está em cartaz até hoje. Augusto César Vannucci. Um pioneiro. Ele andou por um caminho áspero e marcado muitas vezes pela incompreensão, ao se dispor à tarefa de dar câmeras e microfones na TV ao Espiritismo. Mas não recuou jamais. Mesmo quando o preço de tal gesto representasse, como muitas vezes representou, a perda de posições de mando e prestígio.


Fonte: Nova História do Espiritismo - Dos Precursores de Alla Kardec a Chico Xavier



Wanda Marlene e algumas cenas de "Lívia" na TV Itacolomi - Imagens:Carlos Fabiano Braga